Emoções a mil e partos estrambólicos não são o meu forte! Aqui é tudo muito normalzinho, devo dizer.
Este meu gatinho nasceu muito como o irmão, vindo de uma gravidez sem sobressaltos, num parto pouco demorado (ainda menos que o do irmão, como se previa), normal e com tudo o que a medicina me pode dar, graças aos céus! Graças à própria da medicina, quero dizer. E ao Sistema Nacional de Saúde, que seja preservado e acarinhado, que bem precisamos dele.
Entre a entrada no hospital e a vinda do Miguel foram cinco horinhas, uma limpeza. As contrações começaram ao serão, após um pit stop na maternidade e uma tarde de compras (andar, andar, andar...) que pareciam não dar em nada, mas afinal deram!
Às cinco da manhã as contrações já eram bem ritmicas e dolorosas, pelo que lá fomos e deixámos o Pedro a dormir, com a avó a acordá-lo para uma manhã diferente.
Essa foi uma das grandes diferenças entre o nascimento do Miguel e do Pedro. Há três anos eu tive uns últimos dias muito maus, com imensas dores de costas, sem dormir, sem ter posição nenhuma para nada. Desta vez,eu estive bem até ao fim. Dormi bem até à última noite e tinha dores, mas bastava sossegar que elas passavam. Há três anos as dores apenas passaram quando as membranas rebentaram e eu literalmente despressurizei. Assim, eu fui logo para o hospital, mas na verdade nunca cheguei a sentir dores de contrações, porque estava dessensibilizada por conta da dor dos dias anteriores e já NADA me doía! A maquineta apitava e abanava com as contrações e eu... "não sinto nada...", pelo que levei a epidural sem ter dores. Imagino que elas viessem a valer mais tarde, na pior altura possível, mas a verdade é que nunca cheguei a sentí-las, felizmente!
Desta vez, foi tudo muito mais
tradicional. Eu senti as contrações e não foi bonito. Não foi tão horrível como eu esperava, iam em crescendo e tal, mas eu já estou a ver que tenho alguma resistência à dor. Mas que elas doíam, doíam, e cada vez mais e cada vez mais próximas, e eu queria a minha epidural ASAP.
Esse foi o único susto da noite. Quando cheguei à maternidade parece que a minha dilatação era
elástica, e que tinha 3 cm mas podia esticar-se aos 7. ok. Mandaram-me a correr para a sala de partos, para levar a epidural o quanto antes. Acontece que, talvez devido ao adiantado da hora (às cinco da manhã o meu cerébro também é um bocado lento...), o anestesista pareceu apenas ouvir a parte dos 7 cm. E mal entrou, atirou-me logo com um "... 7 cm? Ai, não sei se pode levar a epidural!" Reza a lenda que eu terei respondido "AI LEVO, LEVO!!" Eu vou oficialmente afirmar que não me lembro, porque momentaneamente vi tudo preto e fiquei cega, de tão rápido que estava a ver a minha vida a andar para trás. Mas a versão do marido é essa. E ainda relata a reacção do anestesista, que terá ficado com os olhos arregalados e cara de WTF?!. Mas isso lá o deve ter acordado, porque a enfermeira voltou a trasmitir-lhe a parte da elasticidade e tal e lá tive direito à minha bendita epidural! Tive uma contração em plena aplicação, sem me poder mexer ou respirar à vontade, foi dureza, chorei de dor, mas não me mexi um milímetro e a epidural ficou impecável e cumpriu a sua função lindamente.
Parto sem epidural? Não. É que não, mesmo. Eu não estava de todo mentalizada para uma cena dessas, eu teria subido paredes e pessoas iriam sair feridas da sala de partos, de certeza. Ainda bem que esse não foi o dia em que eu fui parar ao telejornal da CMTV!
Depois deste pequeno apontamento - pequeno...-, tudo correu como tinha de ser. Umas horitas de molho, a dilatar, e depois, the works. O meu obstetra foi um amor comigo, fez nascer o Miguel num instante, pelas 10 da manhã. E diz quem viu, que as suas prendas domésticas são um primor. Óptimo, melhor para mim!
Assim que o Miguel nasceu veio para o meu colo e foi um momento eterno. O meu gatinho, acabadinho de nascer, enrodilhou-se no meu colo, parou de chorar e só olhava à volta, sem ver nada, muito perdido, muito vulnerável. Eu reconheci-o imediatamente, era ele quem andava a dar-me pontapés há meses, não podia ter outra carinha, outros olhos arregalados, era aquele mesmo o meu filhote. "Filhote de homem", como diria o meu mais velho.
O momento das carícias voltou a entrar no quarto, pediu
desculpa por ter-se demorado tanto lá fora, Não encontrava o caminho,
justificou-se, e, de repente, como aos momentos algumas vezes acontece,
tornou-se eterno.
José Saramago - a caverna